Tu Poema de Amor

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Inicio . Carlos Drummond POEMA-ORELHA

POEMA-ORELHA

Esta é a orelha do livro

por onde o poeta escuta

se delem falam mal

ou se o amam.

Uma orelha ou uma boca

sequiosa de palavras?

São oito livros velhos

e mais um livro novo

de um poeta ainda mais velho

que a vida viveu

e contudo provoca

a viver sempre e nunca.

Oito livros que o tempo

empurrou para longe

de mim

mais um livro sem tempo

em que o poeta se contempla

e se diz boa-tarde

(ensaio de bom-noite,

variante de bom-dia,

que tudo é o vasto dia

em seus compartimentos

nem sempre respiráveis

e todos habitados

enfim.)

Não me leias se buscas

flamante novidade

ou sopro de Camões.

Aquilo que revelo

e o mais que segue oculto

em vítreos alçapões

são notícias humanas,

simples estar-no-mundo,

e brincos de palavra,

um não-estar-estando,

mas que tal jeito urdidos

o jogo e a confissão

que nem ditongo eu mesmo

o vivido e o inventado.

Tudo vivido? Nada.

Nada vivido? Tudo.

A orelha pouco explica

de cuidados terrenos;

e a poesia mais rica

é um sinal de menos.